quarta-feira, 29 de agosto de 2012

‎---- “ RECORDAR É VIVER “ ----


Hoje conto este fato com graça, mas à época eram as noites mais pavorosas da minha vida.
Devia eu ter meus oito ou nove anos, e, como era a única menina nas redondezas, brincava com os meninos, jogava bola, ia nadar com eles, brincava de 'polícia-e-ladrão' de bicicleta (era polícia!).
Foi uma infância maravilhosa, na minha linda Praia da Costa, onde nasci e cresci... Minha casa era a única no quarteirão, o resto era mato onde acampávamos com barracas feitas de galhos e lençóis, eu e o meu querido mano Tó, que é um ano mais velho que eu. Íamos para a barraca com suco de laranja ou abacaxi e uma caixa de gibis do Walt Disney, e lá passávamos a tarde inteira... à hora dos mosquitos, desfazíamos as barracas e voltávamos para casa.
Nadar era maravilhoso, tínhamos uma praia limpa e com ondas altas, onde pegávamos 'jacaré' e nos embolávamos na areia com os cabelos desgrenhados, barrigas arranhadas e sorrisos contentes de vencedores: -"viu a onda que eu peguei?" - "muito legal!!!" Às vezes, tomávamos 'caldos', engolíamos água, mas sempre saíamos felizes. E voltávamos para casa cansados e vitoriosos.
O problema acontecia à noite...
Sob as normas rígidas da mamã madeirense filha de militar, às nove horas tínhamos que estar na cama de luzes apagadas. E eu dormia, sonhando com o dia seguinte, os folguedos, a praia, as bicicletas.
Mas no meio da noite, eles apareciam... Era sempre o mesmo recorrente pesadelo. Nele, estávamos todos na praia, e de repente começavam a surgir homens de capuzes pretos e longas túnicas pretas, vindos de dentro do mar para nos perseguir. Eram muitos, bem mais que nós... e os meninos, bem, os meninos ainda eram meninos, e também tinham medo, e nós fugíamos... Corríamos a não mais poder, mas na fuga, uma coisa estranha acontecia... A rua esticava, e as casas ficavam cada vez mais longe, quase não conseguíamos chegar a elas... Como não conseguia chegar à minha casa, entrava na primeira que alcançava, que era a da Tia Maria José, e corria até os fundos, entrava pela cozinha e ia me esconder dentro do banheiro. Nessa hora era salve-se quem puder, eu nem via onde os meninos tinham ido se esconder. E assim que eu entrava no banheiro da Tia Maria José, trancava a porta para respirar aliviada, salva!!!!
Qual!!!!!
Os ditos cujos esgueiravam-se por debaixo da porta, pela fresta da janela, pela fechadura do banheiro, pelo ralo do chão, pelos furinhos do chuveiro, pela torneira e até pelo ralo da pia... eu ia vendo, espremida num canto, aos gritos, aqueles pontinhos pretos irem crescendo e tomando a forma terrível daqueles monstros, enegrecendo todo o banheiro até que eu nada mais via, e acordava assustada.
Nunca consegui escapar deles, e, tonta, ia sempre me esconder no mesmo lugar! Nem para mudar de esconderijo no pesadelo seguinte!!!
Mas também não dei a eles o gostinho de me pegarem... Acordava antes!

                                                    ........................Tixa, 29/08/2012

(Na foto, minha casa, meu paraíso, na década de setenta...)



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